quinta-feira, dezembro 18, 2008

O MEU NATAL


Quando era pequena, gostava do Natal. Talvez pelo mistério, pela surpresa, pela novidade. Era tudo diferente, era uma magia estranha de sorrisos, de festinhas na cabeça e olhares brilhantes! Isto era muito raro lá por casa, só acontecia naquela altura em que havia um pinheiro iluminado no canto da sala.
Percebia que era uma época diferente, mas não percebia bem porquê. Lembro-me de pensar que era porque nascia um menino qualquer, não sei onde. Acreditei algures na minha infância que esse menino era muito especial porque fazia sorrir as pessoas, punha nos seus corações qualquer coisa… Mas onde andava esse menino? Onde nascia? O que é que este menino tinha de especial que eu não tinha? Desiludi-me quando percebi que este menino nascia nas montras iluminadas, que afinal havia muitos meninos iguais, e todos cheios de frio porque estavam despidos coitadinhos! O que valia é que o “bafo do burrinho e da vaquinha aqueciam o menino”… era o que dizia a minha avó, e eu, acreditava!
Aquele menino que eu via nas montras, era igual ao bonequinho que a minha avó tinha no presépio… era simplesmente “o menino Jesus nas palhinhas deitado!”. Ora bolas! Tanta alegria por causa de um boneco, e ainda por cima havia montes deles!! Iguais!! Ele estava em todo o lado… e as pessoas paravam em frente às montras onde ele se exibia, apontavam e sorriam. Nunca lhe vi nada de especial, especial queria ser eu! Bom, mas esta sensação de ciúme impotente por aquele boneco aconteceu quando eu era mesmo muito criança, talvez ainda andasse ao colo. Lembro-me perfeitamente de estar ao colo do meu pai e começar a chorar de raiva por não perceber nada.
Depois cresci (para aí dois palmos), e já tinha percebido que aquele miúdo – o Jesus - ia nascer outra vez. O ambiente ia ficar novamente cheio de luzinhas e estrelinhas e mentirinhas… Era giro aquilo, as prendas no chão por baixo do pinheiro, as notas de escudos que iam aparecendo nos ramos da árvore de Natal, as luzinhas que piscavam, as pinhas (raras) de chocolate… mas as notas de escudos que penduravam no pinheiro é que me entusiasmava! E quando aparecia uma nota azul de 100 escudos??! Era a alegria, muito melhor que qualquer embrulho… Não sou materialista, mas gostava da cor do dinheiro… o verde das notas de vinte, o avermelhado das notas de cinquenta e o azul das notas de 100! Aquilo é que era o verdadeiro enfeite da árvore de natal! Às vezes comento isto com os meus amigos e ninguém tem esta ideia do seu natal, possivelmente foi uma brincadeira que o meu pai arranjou… lá deve ter percebido que eu achava piada aquilo! Sempre pensei que aquele dinheiro era para dar ao Pai Natal, porque no dia em que as prendas apareciam, o dinheiro desaparecia… Enfim, crianças, o quanto vos enganamos!! Vejo por mim… a ilusão em que nos obrigavam a viver, como éramos felizes na nossa ingenuidade de criança!

Continuando no devaneio destas recordações natalícias;
Depois eram as eternas questões para perceber o que raio levavam os reis “magros” ao menino Jesus. E porque é que um deles era preto?
“E levavam ouro, incenso e mirra”. Eu só percebia o porquê do ouro… as outras riquezas não as percebia! Quantas vezes eu pedia para me mostrarem incenso e mirra! Quanto ao rei “magro” preto não era preto, era de cor!!… e vinha de África! Era uma grande viagem… A mirra era uma “coisa muito valiosa naquela altura que não existe em Portugal” e pronto! Explicadissimo!
Estas falhas nas explicações é que me deixavam desconfiada, as crianças às tantas começam a raciocinar e a querer fazer ligações entre as várias informações que tem… algumas coisas iam deixando de fazer sentido…
E a cena de seguirem uma estrela… ui, que confusão! Mas a “estrela era mágica e ensinava o caminho ao reis magos”… e sei lá mais o quê… “Então e rei mago de cor, como é que foi lá ter?”, “a estrela foi a África buscá-lo e depois foi para Belém?”… “Coitado do rei de cor, o que ele não deve ter andado, e o que os outros não devem ter esperado por ele…” foi nestes pensamento infantis que me perdi, e que finalmente me apercebi que tudo isto era uma história para adormecer crianças! E eu detestava ser enganada! O Natal para mim, a partir de um certo momento da minha vida perdeu toda a magia, perdeu as luzinhas, a cor!
Os anos foram passando, agora, apercebo-me que esta época não passa de uma atmosfera de histerismo colectivo da glândula da alegria. Não passa de uma hipocrisia da sociedade. É um pretexto para sermos bonzinhos nesta época. É uma desculpa para sermos solidários com os pobres e com as crianças… É uma oportunidade para estarmos em família, é… diria, lamentável a forma como se vive o Natal.
De qualquer forma, respeito como cada pessoa vive o seu Natal. Eu também estou longe de ser perfeita! Na realidade, o que critico é o que faço! Mas ter esta consciência já me ajuda, já me desperta para uma mudança do meu comportamento.
Depois, penso que todos nós passamos pelas seguintes fases natalícias; acreditamos no Pai Natal, deixamos de acreditar, e finalmente somos o Pai Natal! Somos todos Pai Natal, reparem; andamos disfarçados, andamos com um peso às costas, damos presentes só a quem merece, volta e meia temos que descer por uma chaminé escura para chegar a algum lado… e andamos assim todo o ano.
No Natal, finalmente transformamo-nos em pessoas! Damos valor à família, ganhamos um pouco de consciência do mundo, mimamos as crianças, somos solidários, respeitamos e ajudamos os outros… enfim, temos coração!
A única coisa boa no Natal, a meu ver, é a alegria das crianças, aquele brilho nos olhos que eu também já tive… E se não existissem crianças?! Talvez o Natal se extinguisse, não sei, não fizesse sentido… Talvez o Natal, fosse Banal, como todos os outros dias do ano!
Mas, já que é Natal, e é nesta altura que decidimos ensacar as roupas que não usamos, os brinquedos desajustados às nossas crianças, comprar uns postais para ajudar a UNICEF, uns CD´s para ajudar os meninos escravos, o livro da Leopoldina… ah, e o saquinho com o arroz, massa e bolachas, para ajudar os mais desfavorecidos, vamos lá ser todos solidários! Mas atenção, só porque é Natal!!

As pessoas que passam frio e fome, as crianças que não sabem o que é ser criança, as mães destas crianças que impotentes não conseguem alimentar o seu filho, os países que estão em guerra… tudo isso, que é o mundo em que vivemos, afinal só existe no Natal… Aparecem, surpreendentemente não sei de onde. Talvez da consciência que na realidade todos temos.

Cada um vive o Natal à sua maneira, no meio disto tudo, eu quero acreditar que o Natal pode ser todos os dias!

Partilho algumas imagens da minha árvore e do meu presépio convosco... é aqui, durante esta construção que me encontro com a criança a quem já brilharam os olhos no Natal...

6 comentários:

Anónimo disse...

É simplesmente delicioso ler o que escreves. O presépio está lindo! Sente-se que foi feito com um brilho nos olhos e tu sabes que nunca o perdeste. Ainda continuas a espalhar esse brilho em cada coisa que fazes, em cada coisa que escreves, em cada abraço,... Bem hajas.

Cláudia disse...

Este ano não fiz o presepio, não montei a árvore de Natal, não enrolei a o fio com as luzinhas nos sítios estratégicos; Seja por preguiça, por falta de tempo, porque o ter a àrvore na realidade não significa grande coisa...

No entanto, tento fazer aquilo para mim é o Natal - avaliar-me, e renovar-me. Deixar nascer no meu coração os bons sentimentos, a fé, o acreditar que o Bem pode vencer. Isto não é fácil. Fácil é "brincar ao Natal". E por não ser fácil, todos os anos sinto, de certa forma, uma desilusão, não por não ter recebido a prenda que queria, deste ou daquele, mas por sentir que não vivi dignamente o Natal.

Quanto as presentes, sim, ando atarefada, mais até do que o habitual, pois este ano os presentes sou eu que os faço. Da marca "Cláudia"!

Beijinhos. Que o teu coração acredite nesta "Boa Nova"!

Anónimo disse...

Minha Amiga e mana do coração...desejo-te um feliz natal!
Beijinhos
P.s. os peixinhos estão felizes com o presepio ;)
Susana

Anónimo disse...

Muito bonito o texto! Mas não se deixe cair nessa tendência anti-natalicia. A foto final é mesmo um peixe de aquário, certo? Fantástico!
Vim aqui sem querer, mas possivelmente aparecerei mais vezes.
Continuação de boa escrita!
Já agora um Feliz Natal! Eu adoro porque tenho crianças! O meu Natal é todo a pensar neles, talvez o seu Natal recupere a magia quando for mãe.
C.

Tentativas Poemáticas disse...

Querida amiga Sofia
Muito obrigado pela sua amizade.
Mil beijinhos.
António

Tentativas Poemáticas disse...

Querida amiga Sofia
Desejo que esteja tudo bem consigo.
Beijinho com saudade.
António